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A pergunta pode ter diferentes interpretações, e como tudo na vida, é interessante pisarmos em terreno sólido quando tratamos de definir o escopo desta nossa missiva. Por que digo isso ? "Elementar meu caro Watson", visto que muitos vão responder a esta pergunta afirmativamente enquanto outros dirão um sonoro não a ela. Coloco-me neste segundo time.Houve um tempo que vivíamos na reserva de mercado, e ela não se resumia ao carro que você dirigia ou ao computador que você possuía. O produto da "cultura brasileira" nos era imposto goela abaixo, nas suas variadas formas: músicas, filmes, programas televisivos, livros, etc, (embora ultimamente o governo petista ande querendo ressuscitar este tempo) dando a falsa impressão de que para sermos nacionalistas, tínhamos de gostar de tudo o que era produzido em nossa nação, mesmo que a produção tivesse qualidade duvidosa. Quem não se lembra dos péssimos filmes dos anos 80, onde o estilo reinante era a pornochanchada ? Eu me recusava a assistir a tal "lixo cultural", mas se gostasse apenas dos filmes dos ianques americanos eu não era nacionalista o suficiente. Quem viveu os anos 80 deve se lembrar da era de ouro da MPB, onde você praticamente era obrigado a gostar de Caetano, Gil e Gal. Para onde você virasse o ouvido lá estava a nova música do Caetano sendo tocada, e até hoje os cantores de shopping centers, de bares e restaurantes ainda vivem do resquício desta época. Isto é facilmente percebido pela alta dose de MPB nas apresentações. Mas vou deixar claro aqui: até que gosto de algumas canções dele.
Este tipo de comportamento era tão sintomático que me levou a uma coisa gozada na minha adolescência. Afinal, desde cedo eu já me sentia um cidadão mais "global" do que meramente nacional, apesar de sempre ter tido orgulho de minhas raízes. Lembro-me de um episódio que tive com uma garota do meu bairro. Comecei a frequentar a casa dela para conversarmos, pois queria conhecê-la melhor. Certo dia, bastou-me falar que tinha intenção de fazer um "intercâmbio cultural" em outro país - que acabei nem fazendo - para ela deixar de me ver com bons olhos. Sentiu-se ofendida pelo fato de eu querer ver o mundo lá fora, longe das fronteiras nacionais. Na verdade, acho que a lavagem cerebral da ditadura militar a pegou de cheio.
Mas onde quero chegar com todas estas considerações ? Será que sou um daqueles brasileiros embasbacados que só gosta do que vem de fora, que não sabe valorizar o que "é nosso" ? Longe disso. Eu gosto do que é bom, seja ele produzido no Brasil ou fora dele. Não tenho preconceito se algo foi feito por americanos, por australianos, por irlandeses ou por brasileiros! O que importa é que o produto seja bom para se consumir, e fim de papo.
Vejo que hoje nossos produtos, sejam eles culturais ou industriais, têm melhorado muito, passando então a atender um público, digamos, mais exigente. Penso que o sistema de apuração eleitoral brasileiro é, sem sombra de dúvidas, o mais eficiente do globo. Dia desses eu viajei pela companhia Azul, que usa aviões da Embraer. Tive uma grata surpresa em voar num autêntico avião comercial civil fabricado em solo tupiniquim. Sai do voo elogiando o avião, orgulhoso de estar usando um aparelho de melhor qualidade e conforto que os modelos americanos da Boing ou franceses da Airbus. Tive orgulho do meu país, mas com algo que é verdadeiramente bom (vide comentário no meu perfil do facebook http://www.facebook.com/note.php?note_id=274231345940311). Estamos tendo boas surpresas também no cinema. "Até bem pouco tempo atrás", como diria o saudoso Renato Russo, eu não gastava meu suado dinheiro comprando entradas para filmes nacionais, não pelo fato de não ser nacionalista, mas por não prestarem mesmo! Contudo, produções mais atuais como "Tropa de Elite 2", "Segurança Nacional" e o recente "O homem do futuro" fizeram jus a cada centavo que paguei na bilheteria. O cinema nacional está ficando bom, e sua receptividade tem aumentado, o que prova que audiência não se consegue por decreto, mas por um trabalho bem feito que será apreciado pelo público. Nossos carros, que outrora já foram chamados de "carroças" hoje são confortáveis e pouco devem aos "estrangeiros". Muitos até são exportados daqui para fora. Só são muito caros, muito mais caros que lá fora, mas este é outro debate que não cabe nesta breve consideração, pois suscitaria um protesto contra os impostos abusivos do governo e à avidez da indústria nacional em levar o maior lucro possível.
Enfim, ser nacionalista não é gostar somente daquilo que é produzido em nosso país. Faz bem para a cultura ler os livros de Shakespeare, ver bons filmes produzidos fora do país ou ouvir uma boa música internacional. Não estar restrito ao conteúdo nacional é bom no mundo globalizado em que vivemos, ao tempo em que é muito bom vermos que ultimamente temos ficado competitivos em vários segmentos, inclusive culturais.E nada disso nos impede de sermos nacionalistas ou de termos orgulho daquilo que é nosso mas que é, acima de tudo, bem feito. Não podemos, se quisermos ser parte de uma nação séria, nos apoiarmos no pensamento simplista do tipo: se é "made in brazil" é bom. Afinal, se o nosso país quer mesmo "ganhar o mundo", temos a obrigação de conhecer aquilo que ele produz, pois assim seremos muito mais ricos culturalmente, prontos para os desafios dos anos à frente, onde a pluralidade cultural será cada vez mais valorizada.
OBS: Referencio também um artigo do Gustavo Loschpe, da Veja, cujo teor é condizente com o que dizemos aqui, embora o foco da matéria seja a educação. Vale a pena a leitura: http://veja.abril.com.br/noticia/educacao/voce-acha-que-as-escolas-particulares-brasi-leiras-sao-boas